terça-feira, 16 de setembro de 2008

História de um João e uma Maria - Tarde

Quando há um encontro. Quando nada tem de ser dito. Quando tudo tem de ser, simplesmente. Quando há uma ameaça. Quando o susto. Quando acaba. Quando busca. Quando sem esperança. Quando os períodos do dia passam assim. Quando as estações do ano passam assim. Quando recomeça.

Vamos a esta pequena alegoria sobre todos esses quandos e tudo o que há de patético nessas personagens tão humanas quanto irreais. Tão irreais assim?
Plaza Ramirez, Concepción, Uruguai.
História de um João e uma Maria # 1

Tarde.
Era inverno, todos os corpos resguardados em seus casacos.

Não um típico. O início da tarde tinha algo de primaveril naquela praça. Todas as flores, pássaros, crianças sabiam. Era o melhor dos tempos, quando qualquer coisa poderia acontecer.


Vivia a caminhar, observar, sentir, esse João que andarilha por estas linhas. Todas as vias eram suas, cada dia uma diferente, sem limites. Não tinha compromisso com o mundo ou fazia o possível pra se manter em pé e em movimento. Para escapar das armadilhas.


Mas seus caminhos sempre o levavam àquela praça. Foi ali.


Era uma bela flor, de uma espécie que ele nunca teria observado sob alguma circunstância diferente. Não pensou, mas poderia ser a luz, o ângulo de incidência dos raios do sol sobre todas as coisas, principalmente a flor, que era gente.


Esse encontro imprevisto. Quando os olhos se encontram, quando um pequeno gesto...

Quando diz é.


Ele fica ali, do outro lado do caminho. Para mirar. Ela, à pequena distância, no banco. Estático momento extático. Ambos.


Apenas olham. Por instante breve que o artista bem que gostaria de emoldurá-lo para a eternidade. E é assim, ainda que efêmero.

A música dos pássaros ecoa. Entre elas, João capta a melodia que diz:


O nome da flor é Maria.

Que se levanta. E vai.

Todos os caminhos levam àquela praça e João sempre passava ali, meio-dia, meia-noite, três da tarde, qualquer hora, quase sempre. Percebeu, nos outros dias, a presença. Quinze minutos, naquele banco, permanecia Maria. No segundo que sucede o último daqueles minutos, a visão esvaecia.

João gostava daquilo, de encontrar Maria. Passava aqueles minutos sem andar, mirando e mirando. Ela tem a arte. E também mirava João. Maria gostava daquilo e gostava de poder ir. A flor percebida sempre estava lá. O sol também. Durante aqueles minutos, a imagem natural, antes que fosse levada de seus olhos.

Ficava a memória e a vontade de dias vindouros...

E vinham, esses outros dias. Cada vez mais gostavam daquele exercício, sem dizer palavra.

Um dia
, pensava João, um dia colherei esta flor.

Mas percebeu, então, que se modificasse o gesto, se levasse a flor consigo, os raios daqueles instantes iriam incidir sobre o nada. O que era magia seria perdido para sempre. Ou encontraria um lugar em que incidiria a mesma luz? De qualquer forma, as flores morrem.

Não aquela, não aquela, desejava.

A continuar

Depois de tanto, depois de nada, resta deixar beijos e abraços. Volto logo!

NA MINHA VITROLA: COLDPLAY - Yes.

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