Um dia de céu limpo, uma dose de conhaque, o porco engravatado que rumina dinheiro alheio, as noites solitárias, as crianças fazendo algazarra, amores possíveis e impossíveis. Tudo o que há sob o sol (e além do sol) é a matéria da poesia.
Este blog é um livro inconcluso com páginas abertas para que você encontre textos escritos com verdade, sentimento e, principalmente, com ALMA.
Uma viagem que nunca termina. Por Alessandro de Paula.
Contatos em palavratomica@gmail.com
Cumprem-se os 365 dias. (É, conferi no reloginho do note, pra ver se não tinha sido ano bissexto. Não foi.)
Não houve nesses dias um em que não tivesse corrido, amado, falado sozinho, brigado com o relógio, esperado que alguém me chamasse ou chamado alguém.
Ouvi muita música, ouvi queixumes de quem não aguentava o ritmo de trabalho, ouvi uma voz especial no ouvido. Disse coisas bonitas e outras tristes. Perdi o controle, o equilíbrio. Encontrei-me de alguma forma. Ou estou em curso disso - afinal, todas as coisas estão em curso, não é? Os processos não param pra ver fogos de artifícios, por mais belos que sejam.
Bebi menos, li mais.
Trabalhei em vários lugares. Em cada lugar, o tempo de um projeto. Travei conhecimentos, fiz amigos.
Escrevi pouco, tenho dois projetos em mente, dos quais voltarei a falar no momento certo.
Acompanhei a vida dos amigos. Vi gente cair e também vi gente se levantar. Tive minha queda, num momento importante, e pensei que tudo estava perdido, mas pude me levantar. O melhor da queda, dizem alguns, é rir-se de si mesmo. Eu digo, como outros dizem, que é seguir em frente. Aqui estou.
Fiz tantas coisas, que um post simples em um simples blog não daria conta. Os 365 dias e noites do ano são testemunhas e isto basta.
Estou pronto, com minha grande barriga, com meus pés fortes e com uma reserva a mais de suor e neurônios pra 2011. E com amor no peito, porque não se vive sem amar a vida.
Vem, que eu mato no peito e mando pro gol, Jabulani!!
Até 2011, amigos!! Que Nina Simone, logo abaixo, os abençoe!
Desculpe, mas se uma pessoa conhece outra e tem prazer em conhecê-la, e então leva-lhe dois soldos ou duas liras a mais por um serviço que deveria ter sido gratuito devido ao grande prazer que teve em conhecê-la...
... quem é esta pessoa, senão um homem que ofende o mundo?
Às vezes confundimos as pequenezas do mundo com as ofensas ao mundo."
Este breve trecho do diálogo final em Gente da Sicília, filme do casal Jean-Marie Straub e Danièlle Huillet me parece toda filosofia do mundo.
Claro, não é toda. Mas parte importante. Por isto, quis dividir este pequeno trecho com vocês.
Assisti a este filme, o novo de Julio Medem, que está em cartaz em Sampa e, provavelmente, noutras cidades.
Curiosa e diferentemente de outros filmes dele já vistos por mim (Os amantes do Círculo Polar, Lucía e o sexo e Caótica Ana), que abordam períodos de vida mais longos de suas personagens, neste Um quarto em Roma, Medem se atém a um momento breve da vida das protagonistas, a russa Natasha, que no decorrer do filme revela-se Dasha, e a espanhola Alba. E sai-se muito bem.
O filme trata da relação tão efêmera quanto intensa de duas mulheres que se encontram na noite romana, enquanto afogavam suas mágoas. Vão para um ambiente perfeito: um quarto de hotel em Roma, com gosto de história, de Renascimento.
Fantasia e realidade se mesclam. Os nomes e histórias que inventam servem para desnudá-las, para trazer suas verdades à tona. Há um amor que precisa ser vivido, ainda que tenham, à alvorada, que despedirem-se - não sem sofrimento - e retornar às suas vidas.
A nudez e a relação homoerótica nunca são ordinárias neste filme. É o sentido contrário do que a grande mídia quase sempre expõe, "ordinarizando" estes elementos. (Bom... o que a mídia não "ordinariza", nestes dias?)
Fiquei a pensar se amor não é o momento e depois tudo se esvai. Ou se amor é outra coisa que não sei o que pode realmente ser. Outra ilusão grandiosa? A maior de todas as quimeras?
Bom, depois de minhas constatações e divagações, apenas concluo dizendo que...
Alimenta-se de sorrisos. De sol. De sombra. De água fresca, embora prefira cerveja. Alimenta-se do carinho, de amigos. Da luz e das cores das noites festivas.
E, ainda assim, não é um ser vampiresco em seu túmulo arquitetando tolos planos de conquistas vazias.
Nem oculta o que tem de mais belo por autossabotagem, banhando-se em ilusões de consumo, mostrando-se assim artificialmente seguro em sua torre de cristal que lentamente desmorona.
É! Quanto mais high, mais low.
Desculpem tal poeta, tristes pessoas das trevas do mundo. Não descerá novamente ao inferno. Não estará em busca de uma Beatriz que não há.
Não será um poeta maldito. Tampouco bendito. Poeta apenas humano que ainda tenta aprender a amar, que sabe o árduo do caminho, porém não desiste. Pois sabe que além dos clichês, do trato e destrato social, das palavras mal-ditas, dos cigarros e pulmões enegrecidos, há redenção. Uma religião sem bandeiras.
O poeta acredita em vida nesta vida.
A morte nesta vida deixa aos habitantes da torre de cristal que já se esqueceram de como sorrir.
Já não sou tão novo e cada vez mais, conheço os mares onde navego. Um pouco de leve poesia em meio à tempestade não será ruim.
A arte da navegação
Existir e não se se perder com os ruídos ao redor. Existir e não lamentar o passo que já é passado.
Içar velas e navegar. Vil vidas, mil mares, mil vidas.
O marulho, marujo, é o que há de levar-nos ao próximo destino. Haverá um porto onde atracar.
Prosseguir alegre na calmaria e valente na tempestade.
Já não tão novo. Trinta e sete longas jornadas. Existo e agradeço a todos que, de algum modo, viajaram neste barco. Aos que viajam. E aos que ainda terão os pés nesta embarcação humilde, porém forte e grávida de novidades.
Luz pra quem é de luz, trevas pra quem é de trevas. Beijos e abraços aos amigos.
Quando o mundo está estranho. Mas, para o mundo parecer estranho, há que haver um parâmetro inicial de como alguém enxergou o mundo pela primeira vez.
Então, em algum momento, as coisas pareceram sair do lugar.
Os eventos vão atirando estes pequenos e grandes objetos nas nossas caras, por que tudo está sempre mudando. Nem sempre percebemos, até que sejamos atingidos.
Então dizemos: "o mundo está estranho".
E isto está acontecendo. Cada vez mais rápido. "O-mundo-está-estranho" não é informação nova. Toda hora uma estranheza nova.
Irão os objetos do mundo serem recolocados em seu devido lugar alguma vez? Improvável.
Por isso, o poema. Vários objetos que atravessam o ar e nos atingem. Eles vêm de diversos pontos. Não sabemos bem o que são. Apenas um vislumbre rápido.
Uma tentativa de não organizar organizando, não fixar fixando. Ou apenas mais um poema caótico no mundo, a ser atirado no ar.
Tudo fora do seu devido lugar
Que fique bem claro: chiste é chiste, not shit. Letra de música não é poema, mas pode ser poesia — sobretudo é letra de música.
A intelectualização de alguns temas não deveria ser proibida, porém por vezes é improdutiva. Masturbação.
Ou antimasturbação, amor.
Sinto tesão pelas ideias, mas por favor, não abuse.
O ministério da luz agradece.
Hippie de hoje é fake. Woodstock hipócrita. Hollywood já foi sucesso, hoje é câncer ou impotência ou...
Tempos terríveis em que vivemos.
Da área VIP eles riem de nós, amor. Ouquei, vamos sacudi-los. Ainda que bregas, porque chiques como eles não interessa ser.
Brainstorming. Na rede elétrica em meu corpo recebo os raios.
E funciono.
Não sou máquina, não repito algoritmos. Rompo-os quando consciente.
Ao menos.
A mais, tenho amor. Estava em falta no mercado. Não paz nem guerra, Tolstói.
Não é minha praia. Nem o festival, que eu já desconfiava que ia ser um "Woodstock fake" (ora, leiam algumas impressões aqui); tampouco a banda, que empolga muitos mas nunca me ganhou de verdade.
Mas pra quem gosta, aí vai: show completo do Queens of Stone Age no SWU, em 11 de outubro, Itu - SP.
Beijos e abraços, pessoal! Mais tarde, ainda hoje, haverá poema novo aqui.
Poema de poesias. Daqueles que dizem nada e... tudo.
De flores escrevo poesias para rosas é isto que faço e sou um sol uma noite fria sucintamente penetrante nos corações vazios nos ouvidos mudos já fui também coisa para quem não tem olhos ou boca a tarde na praia ou a lua constante faço isto para ninguém e para mim escrevo prosas para marias
Vulnerável, quer a invulnerabilidade. E isto apenas torna mais humano. Não é incrível que haja ainda poesia em todas essas criaturinhas que se chocam buscando um espaço no metrô de uma cidade grande?
Ou isso está somente no poeta? Ah ah ah!
Bom, vamos à próxima!
Verbo e homem
Quis ser um verso de poesia. Poemas e seus versos, eles só provocam. Não são afetados por coisa alguma. Mas não era.
Carneosso. Sentimento.
Pode morrer por dentro, mas o verso fica.
Ou era?
Era sua paixão, seu ciúme. Era aquela briga e reconciliação. Dedo apontado na cara, olhar perdido e encontrado. Beijo molhado, incendiário. Mil juras. Amor imaginado e consumado. Voz no telefone, tensão do primeiro papo. Tesão.
Presente mais lindo do mundo. Embrulho, desembrulho. Satisfação e sono e acordar e encontrar e mais mais mais...
E verso também.
Verbo quer ser homem, carneosso. Sentir. E viver.
Cada um quer um pouco mais do que tem. Alguns já nem se lembram disso e a "coisa" fica ali, escondida. Mas há.
Show dos ingleses do Tindersticks em 8 de agosto de 2008, no Festival Sudoeste, em Zambujeira do Mar, Portugal. A banda é "classuda", seu repertório, pra quem não conhece, é uma mescla cheia de sensualidade, tristeza e delicadeza. Seus arranjos são de uma de uma suntuosidade à beira da perfeição. Tomara que gostem.
Formação Stuart Ashton Staples - voz, guitarra Neil Timothy Fraser - guitarra, vibrafone David Leonard Boulter - teclados, percussão
E aí, gostaram? Espero que sim. Beijos e abraços, pessoal!
Uma fragata que afunda, um dia com céu mais limpo, uma dose de conhaque, o porco gordo que vomita dinheiro alheio, mil noites de solidão e TV ligada.
Tudo isso e muito mais é tema de poesias. Mas nada foi tão falado em poesia, como o amor. Mesmo que seja um amor torto, de meleca no nariz e unhas encravadas.
Pois é. Hoje, pessoas, entrego-lhes um poema de amor. Um entre tantos. Um.
Alva Iracema
Houve um poeta na noite, andando borracho pelas calçadas, ziguezagueante e não com muito destino, apenas nevoeiro demasiado, tropeçando em pedras nas vias. Nada havia à sua frente que o pudesse inspirar.
Vazia, então, era a poesia.
Com suas folhas em branco a se perder a conta.
Todas as garrafas por ele esvaziadas registravam sua história de nadas e nadas. Miserável, ele observava o nada que era existir.
O que havia de dormido em si era algo calado que ele esperava que talvez ainda emergisse. Mas não, já não esperava com todo ardor.
Até que num dia desses, um desses dias de pouca ou nenhuma esperança –, ou nenhuma ou pouca dor – uma voz o chamou. E ele a ouviu.
“Diabos, era uma voz sedutora.” – disse ele, rendendo-se ao magnetismo. Desfez-se do estado de torpor.
Alguma coisa ali se acendera.
Era Vênus quem portava aquele litro e vinha em sua direção. Um trago de paixão insana... e o poeta enxergava, enfim, sua pequena.
Tempestade e ímpeto. Ele irá ao seu encontro.
Atirou rua abaixo suas defesas e gritou que ainda havia amor. Passou a haver. Feliz fatualidade da vida.
Shelley e os outros caras estavam, em parte, certos.
De todos os poetas largados do mundo – e trata-se de um numeroso grupo –, agora é o mais feliz e, também, às vezes, atormentado quando a visão lhe falta. Sobretudo quando lhe falta o toque.
Jamais desapareça, ser tão venerado. Nunca mais torne o poeta a sentir desesperança. Brota a flor cerca o esterco dos animais. Ainda assim, a mais sublime figura de amor que já não esperava.
Agora existe.
Guarda em teu seio a mensagem. Com ímpeto e sob a tempestade,o poeta vencerá concreto e distância, atravessará rios e montanhas.
Ele irá ao seu encontro, alva Iracema.
Juntos, então, serão felizes. Haverá sorrisos de parte a parte. Olhosnosolhos, carnenacarne. Nesta terra.
Todo esse noticiário sobre a morte da ex-amante do agora provavelmente ex-goleiro do Flamengo me fez pensar em coisas. Diversas delas.
Uma de tais coisas foi tentar ver o caso através dos olhos de um investigador policial, um tipo que tem de ser duro no meio em que vive. E que provavelmente não é o tipo que escapa de ter certos desvios psicológicos. Quis tratar isso não com a rudeza do meio, mas com uma tentativa de aprofundamento em sua personalidade. Não sei se consegui, até porque se trata de uma poesia, mas o resultado é este:
Particularidades de um Homem Forte
Boa noite, cara família que me pasma com sua tranquilidade em seu confortável jogo de sofás de cores neutras.
Sento-me num deles, mas não posso desfrutá-lo como desejo, pois mesmo quando posso não estou sozinho.
O pequeno está no quarto e me chama para passarmos algum tempo. O tempo que uso fingindo afastar fantasmas.
Ouço a voz daquela mulher que, tola, ainda anseia algum calor de mim sem perceber que tudo ao redor é gelo.
Mal durmo nesta noite e assim é em todas as outras noites frias desde que escolhi ser quem tenho sido.
Nas manhãs desoladas já não tolero as vozes e quase me acidento ao volante no caminho para o martírio.
Lá estão os monstros todos, na minha mesa e ao redor só se fala disso. Então saímos, eu e meus companheiros.
Outra missão a cumprir. Mais uma vez, outra busca sem esperanças. Apenas esta vítima e o corpo há dias inerte.
Não rezo pela humanidade. A crueldade que vejo não mais me atordoa e faço-me forte perante os que me buscam.
Quando enfim estou só, o choro de cada ser que parte – e dos que ficam – é minha companhia quando volto à casa.
Até amanhã, trágica rotina. Invejo a tranquilidade de minha família e não posso partilhar o que vai adentro.
Ainda que, quando acaba, não queira mais ser o que tenho sido: o investigador.
Já está online, disponível pra download gratuito, a sexta edição da Revista Cultural Novitas. Matérias quentíssimas com os multimídias Xico Sá e Abilio Manoel, o artista plástico Silvio Alvarez, entre outras.
Também estão quentes as seções de crítica literária, contos, crônicas e de poesias. Está última, onde eu compareço com Não Ofereça Flores a Fantasmas (está na pág. 11).
Visitem e baixem a nova edição, assim como as anteriores, aqui.
É, a Playboy portuguesa reverencia José Saramago. E traz Jesus e uma desnuda Maria Madalena na capa. Claro que haverá ou já está havendo celeuma por parte dos setores mais tradicionais da sociedade lusa.
Por isso futebol é fascinante. Lugar comum, eu sei.
Mas vi uma Europa decadente, que foi mostrada noutro post aqui. O que só fui ver com o passar dos dias é outra Europa: a triunfante.
Claro, Uruguai ainda pode resgatar o orgulho sul-americano, mas ainda assim, é muito improvável, visto que terão diversos desfalques quando entrarem em campo contra nossos mais recentes algozes, os holandeses. Do outro lado, uma Alemanha de futebol incontestável e uma Espanha que poderia ter rendido mais, mas que é capaz de levar o caneco, sim.
Pois que seja! Estamos muito perto de ver, pela primeira vez, uma seleção europeia ganhar uma Copa fora de seu continente. Coisa que era privilégio apenas de brasileiros, que ganharam em 1958 na Suécia e em 2002, na Coreia do Sul e no Japão.
Que a Copa da África do Sul está sendo estranha, está. E feia, com menos gols, tudo isso. Poucas seleções escapam da decepção. Curiosamente, as que estão se dando bem são as latino-americanas, ao menos por enquanto. E a Holanda, que neste ponto, é a primeira e única classificada à próxima fase.
Acredito no fator Jabulani. Uma bola tão diferente, tão leve, que os praticantes do desporto criado pelos ingleses e aprimorado pelos brasileiros estão tendo de se readaptar. É quase um novo esporte. Mas alguns não se adaptam tão rápido.
Também creio no fator globalização + internet. Hoje é muito fácil pra seleções menos tradicionais estudarem os estilos, as escolas futebolísticas. Aliando essa facilidade de estudo a uma boa dose de força de vontade, é possível que haja surpresas. E estão acontecendo.
Pior para a França, que reedita o vexame vivido em 2002, na Copa da Coreia do Sul/Japão. Ou seja, corre o risco de sair da competição sem marcar ao menos um gol, depois de um empate pífio com o Uruguai e de se render ao México, que ganhou com o placar de 2 x 0.
Mas as seleções do Velho Continente têm de por a barba de molho mesmo. Pois a Inglaterra conseguiu apenas empates contra EUA e Argélia, com direito a falha do goleiro Green, a primeira vítima da era Jabulani.
E a Itália vai no mesmo caminho, apenas empatando com Paraguai e com Nova Zelândia. Apesar de que a Itália... bom, quem acompanha futebol com frequência sabe que é quase uma tradição a Itália começar mal nas Copas. Pois é, algumas vezes, apesar disso, os italianos terminam campeões.
Mesmo a Alemanha, que começou tão bem, ganhando de 4 x 0 da Austrália, na rodada seguinte sofreu seu revés ao perder de 1 x 0 pra Sérvia. É um grupo jovem e promissor, mas a inconstância da juventude pode ter um preço alto demais aos alemães.
Já a Espanha vinha sendo considerada por especialistas como a grande favorita ao título. Começou perdendo a cabeça e o jogo para a Suíça. 1 x 0.
Mas, como veem, se o fracasso (por enquanto, momentâneo) de seleções europeias (e também, podemos acrescentar, das africanas, as "donas da casa") gera uma situação dramática pra quem costuma torcer pra essas grandes potências. Seleções europeias de menor expressão e, principalmente, as latino-americanas tem sido favorecidas por tal quadro. Não apenas Brasil e Argentina, sempre credenciados ao título, mas desta vez, Chile, Paraguai, Uruguai e México podem sonhar com a chance ir um pouco mais longe neste torneio. E com razão.
Tenho grandes expectativas de uma semifinal latino-americana, ainda que, por mais que tenham soltado as zebras na África do Sul, seja um feito dificílimo de ser alcançado.
Vejamos a continuidade da era Jabulani. E das vuvuzelas.
José de Sousa Saramago, 16.11.1922 - 18.06.2010. Foto de 1996 por Sebastião Salgado, em Lanzarote, Ilhas Canárias, onde o autor viveu até seus últimos dias.
"Então ela, a morte, levantou-se, abriu a bolsa que tinha deixado na sala e retirou a carta de cor violeta. Olhou em redor como se estivesse à procura de um lugar onde a pudesse deixar, sobre o piano, metida entre as cordas do violoncelo, ou então no próprio quarto, debaixo da almofada em que a cabeça do homem descansava. Não o fez. Saiu para a cozinha, acendeu um fósforo, um fósforo humilde, ela que poderia desfazer o papel com o olhar, reduzi-lo a uma impalpável poeira, ela que poderia pegar-lhe fogo só com o contacto dos dedos, e era um simples fósforo, o fósforo comum, o fósforo de todos os dias, que fazia arder a carta da morte, essa que só a morte podia destruir. Não ficaram cinzas. A morte voltou para a cama, abraçou-se ao homem e, sem compreender o que lhe estava a suceder, ela que nunca dormia, sentiu que o sono lhe fazia descair suavemente as pálpebras. No dia seguinte ninguém morreu."
José Saramago em As Intermitências da Morte, 2005.
Vamos lá, que é hora de fazer este espaço ser alguma coisa mais uma vez.
Então vou começar contando como vai a vida.
Neste ano, tive propostas de trabalho bem cedo. Foi animador e também recompensador. Apenas um mês e uma semana depois do último freela de 2009. E os quatro meses que passei na editora grande de livros didáticos valeram a pena. Dez dias de folga e lá estava eu assumindo outro compromisso, outro freela, noutra editora, essa um pouco menor, mas também com nome no mercado.
Claro que é muito bom ter desafios e experiências novas pro currículo. Mas é custoso, também, quando se mora num bairro relativamente afastado de tudo e quando se vive numa cidade tão insana, com uma população enorme e igualmente louca como São Paulo. Por isso, tive a certeza de que, morando próximo de onde as coisas acontecem, tudo seria mais fácil. Mas não é fácil dar este passo sem haver uma certa estabilidade.
Verdade que trabalhei e sigo em frente, mas tal estabilidade ainda não existe. Não se pode planejar a vida a contento quando o que você tem são freelas, por mais generosos que possam ser pra você. Uma hora isso passa, simplesmente.
Enquanto estava pelas vias de metrô, ia pensando no sentido de tudo isso (e às vezes essas reflexões - e as viagens - eram/são interrompidas por algum maluco que se atira[ra] na linha do trem).
Não, não reclamo de trabalho. Esse Alessandro que reclamava acabou, até que deem motivo. Não me deram tais motivos, felizmente. Mas pensava no porque de uma pessoa se locomover entre lugares distantes pra ter dinheiro. A resposta era prática: as contas em dia, a cirurgia da mãe, pequenos confortos e alegrias particulares. E, diabos, esta história de locomoções é a coisa mais comum que há.
Mas sacrifiquei minha criatividade e este espaço sofreu os efeitos disso. Não porque a rotina corrida exigisse isso. Não era tanto o caso. Era mais a velha questão que me afligia desde o ano passado, sobre a validade de continuar produzindo poesia num contexto em que tanta gente pouco lê.
Mentira! Puro egoísmo. Se há esse contexto, há um outro que me é muito particular. Porque no decorrer da vida, fui construindo meu universo. E posso dizer que escolho a dedo quem pode entrar nele. Afinal, posso escolher não ser afetado pelo contexto global.
Foi assim que me vi cercado de pessoas interessantes, que tem sim interesse em leituras. São pessoas que "leem o mundo" tanto quanto eu. Umas um pouco menos, outras um pouco mais. E prova disso é que este blog não deixou de ter certa visitação durante minhas longas "férias". Não foram raras as vezes que me perguntavam, em encontros combinados ou fortuitos, se eu estava escrevendo algo.
Bom, fiz pouco disso e não publiquei aqui. É provável que não publique aqui muito do que escrevo, nos próximos tempos, porque volto a ter projetos. E alguns desses projetos exigem ineditismo. Mas este espaço não estará mais abandonado.
Pois se perderá algo sobre minha própria produção, ganhará em "projeção do externo". Sem perder a alma. Então não se preocupem, gente minha.
Sempre voltarei. De uma forma ou de outra. E, a partir de agora, com mais frequência.
Já não é mais hora de esperar ou refletir. É hora de fazer acontecer.
Beijos e abraços. E não deixem de torcer por mim.
PS: A foto que abre este post é minha, com alterações providenciais (ou um pouco over - não deixem de me dizer, se for o caso) feitas no Picasa, do Google.
Esta poesia é um pouco um mea culpa por meu desaparecimento.
Poderia dizer que tirei férias do blog. Não é verdade. Embora esteja vivendo ainda "com alma", não houve possibilidades de trazer pra cá algo que eu tivesse feito "com alma". E não pretendo mentir a vocês, porque são espertos, entendem tudo. Ou, ao menos, é o que suponho, acreditando também que alguém ainda visita este canto esquecido da net.
Às vezes - muitas vezes, aliás - um cara, um poeta, tem mil possibilidades de comunicar-se, de expressar o que sente, o que há. Mas o mundo tem um ritmo avassalador - vocês sabem bem - e esse cara pode simplesmente se acomodar, deixar-se levar sem nada produzir. Mesmo quando ele é um poeta. São milhares, milhões de sensações que vêm e que vão embora, se é permitido que elas não aflorem numa folha. Ou num monitor.
Mas aqui estou. De volta ao lar. De volta ao sentido de existir. Porque posso assumir tantos e tantos papéis. Mas isto aqui é o que sou. Acompanhem.
Sou poeta. Sou poeta até quando não estou poeta. Quando a velocidade do mundo tira o fôlego. Quando percebo o detalhe na esquina horrenda. Em qualquer metrópole. Em qualquer trem suburbano. O brilho dos olhos da menina. A minha, dos olhos, é a poesia. Mesmo a não escrita, a jamais publicada. A que não se lê nem se vê. Vive-se. Sente-se e leia. Ou sente-se apenas.
Poesia não é bula de remédio. Nem número de telefone. Não se decora, guarda-se na alma. Na memória, mesmo traduzível só em sensação.
Ser poeta é não estar morto. Embora se deva homenagear os que vieram antes. De Cesário, o Verde, a Drummond. De Leminski a Valèry. La mer, la mer, toujours recommencée ou Florbela que brota sempre, sempre.
O poeta pode até não rimar, mas não pode morrer. Pode ser ridicularizado, deixado pra trás. Considerado anacrônico. Ele precisa da dor, do desprezo. Assim como do deleite. Dos pequenos belos gestos de simpatia. E há tudo de sobra. Como não ser poeta, não recolher todas as ações e reações? Como não carregar tudo pela vida adentro? Simplesmente existir como um fogo-fátuo? Ah, a não existência...
Não, um poeta é de carne e osso. E sentimento. E memória. Um catalogador de pessoas. De lugares. Do que não é comumente catalogável.
Ainda que não se escreva um verso por dia. As ondas afastam-se, apenas para retornarem. Fracamente, fortemente. Verdadeiramente. Quem nasce poeta, assim permanece. Assim existo. Sou poeta.
Pretendo retornar ainda neste fim de semana. Há mais poesia. E há algumas pequenas listas que, publicadas tradicionalmente ao fim/início de um ano, estou devendo.